
27/05/2025
Do plano à prática: o caminho do Brasil para a Economia Circular
*Flávio de Miranda Ribeiro, Embaixador do Movimento Circular
No dia 08 de maio, o Fórum Nacional de Economia Circular aprovou por unanimidade o Plano Nacional de Economia Circular (Planec), um marco fundamental para o avanço do tema no país. Este fato vem se somar a diversos outros, como a realização em São Paulo do WCEF – Fórum Mundial de Economia Circular, para o que temos chamado de “ano da Economia Circular” no Brasil. Neste artigo, comento como o Planec se encaixa neste contexto, suas principais determinações e as perspectivas do que podemos esperar a partir de agora.
A publicação do Planec é um desdobramento da ENEC - Estratégia Nacional de Economia Circular, estabelecida pelo Decreto Federal n° 12.082/ 2024. Além de trazer o conceito de Economia Circular pela primeira vez na nossa legislação, o Decreto estabelece diretrizes e objetivos, e determina que o MDIC – Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços institua o Fórum Nacional de Economia Circular, responsável por assessorar, monitorar e avaliar a implementação da ENEC, o que ocorreu no final de 2024.
Importante destacar que a ENEC está vinculada a duas outras políticas de grande relevância: a Nova Indústria Brasil, voltada a promover uma “nova revolução industrial”, com base na sustentabilidade, com previsão de investimentos da ordem de R$ 300 bilhões; e o Plano de Transformação Ecológica, programa do Ministério da Fazenda que visa impulsionar o desenvolvimento sustentável, combatendo as mudanças climáticas e as desigualdades, tendo a Economia Circular como um de seus seis eixos de atuação.
Foi a partir desse contexto que o governo federal convocou representantes de governo e da sociedade civil, incluindo diversas entidades empresariais, para elaborar uma minuta do Planec. Após ser submetido à consulta pública no começo deste ano, o texto foi aprovado e publicado – podendo ser consultado na íntegra no site do MDIC.
Com horizonte de 10 anos (2025-2034), o Planec contém 71 ações, divididas em cinco eixos, dedicados a: Ambiente normativo, com foco em impulsionar mercados de produtos reutilizados e recondicionados; Inovação e educação, visando fomentar pesquisa, formação e disseminação de conhecimento; Redução de resíduos, com foco em eliminar lixões e consolidar políticas de logística reversa; Instrumentos financeiros, voltado à criação de incentivos tributários e fundos específicos para a circularidade; e Articulação interfederativa, que busca fortalecer a coleta seletiva e as cooperativas de catadores por meio da colaboração.
Dentre as ações específicas existem menções à necessidade de criação ou ajuste de políticas publicas, com um forte viés ao avanço da logística reversa no país; propostas de novos instrumentos financeiros, incluindo uma PEC sobre a bitributação dos materiais reciclados; a necessidade de articulação da União com Estados e Municípios, principalmente para fortalecimento das cooperativas de catadores, dentre diversas outras previsões essenciais para acelerar a transição para a circularidade.
Considerando a missão do Movimento Circular, podemos destacar em específico o Eixo 2 – voltado a fomentar a inovação, a cultura, a educação e a geração de competências. Neste caso, podemos citar a proposta de ampliar a educação para a circularidade, desde capacitações para as carreiras mais técnicas até a conscientização da sociedade geral, com a criação de programas de incentivo em todos os níveis de ensino. São também de grande relevância o fomento à pesquisa, desenvolvimento e inovação, mediante editais específicos; o estabelecimento de um programa nacional de simbiose industrial; e ações de incentivo às indústrias para modelos de negócio como o reuso, busca pelo aumento de vida útil dos produtos, e desenvolvimento de produções regenerativas.
Com o Planec lançado, o MDIC agora se dedica a discutir a sua implementação, usando para isso a mesma estrutura de governança do Fórum Nacional, com a divisão dos Eixos entre seus membros. A proposta é que cada um destes grupos de trabalho se reúna quinzenalmente nos próximos meses, com os 10 colideres se encontrando mensalmente para debater questões em comum, e com o Fórum se reunindo para deliberação a cada três meses.
Visando os próximos passos, uma iniciativa fundamental é estabelecida na primeira ação do Eixo 1: “Desenvolver um Diagnóstico Nacional Setorial, incluindo indicadores de acompanhamento de performance de circularidade”. A proposta é que esta seja uma das primeiras iniciativas a se realizar, pois será a partir deste diagnóstico que o MDIC revisitará o Planec dentro do período de um ano, para inclusão de metas, indicadores e definição do período de revisão adequado.
Paralelo a isso, outra ação importante para o futuro próximo é selecionar atividades prioritárias e elaborar seus planos setoriais, de forma a abordar temas específicos para avanço da Economia Circular – algumas entidades do Fórum inclusive já apontaram possíveis candidatos, como siderurgia, construção civil, indústria automotiva, alimentos e bebidas, cosméticos e produtos de higiene, têxtil e eletroeletrônicos.
À parte da evolução do próprio Planec, é de se esperar também que o tema ganhe novo ânimo com a realização da COP-30 ao final do ano aqui no Brasil, considerando o potencial de contribuição da Economia Circular para as estratégias de mitigação e adaptação. Prova disso é a presença da Economia Circular na nova NDC brasileira, publicada ao final de 2024, que dentre outras menções coloca como um dos objetivos nacionais de mitigação “Promover a circularidade por meio do uso sustentável e eficiente de recursos naturais ao longo das cadeias produtivas”.
Com essa prioridade estabelecida, acreditamos que o Planec poderá interagir com a construção da política climática do país, por exemplo induzindo a inclusão de estratégias circulares nos planos setoriais de mitigação – principalmente nos casos da indústria, agropecuária e resíduos. Já existe inclusive uma articulação do Fórum Nacional de Economia Circular com a Presidência Executiva da COP, buscando alinhamento e prevendo um “dia temático”.
Definitivamente, esse é o ano da Economia Circular no Brasil – mas não um ano qualquer, e sim o primeiro de muitos que ainda virão trazendo novidades e avanços para a transição rumo a um país e um mundo cada vez mais limpo, justo e circular. Aqui pelo Movimento Circular seguiremos atentos e participativos, colaborando para apoiar a implementação do Planec e suas ações.
Fique atento, siga nos acompanhando e vamos juntos fazer a mudança acontecer!
*Profº Dr. Flávio Ribeiro
Embaixador do Movimento Circular. É Consultor e Professor em Economia Circular, Logística Reversa e Regulação Ambiental Empresarial. Engenheiro Mecânico, especialista em Gestão e Tecnologias Ambientais e Análise Pluridisciplinar do Estado do Mundo. Mestre em Energia e Doutor em Ciências Ambientais. Conselheiro para Economia Circular do Pacto Global da ONU. Professor na Pós-Graduação em Direito Ambiental Internacional da Universidade Católica de Santos, na FIA Business School e na Trevisan Escola de Negócios.