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16/03/2023

Moda Circular é mais do que tendência

Por Julliana de Melo, especial para o Movimento Circular

Na contramão do modelo fast fashion e de um descarte acelerado das roupas, outra forma de pensar, produzir e vestir vem conquistando cada vez mais espaço nas fábricas, passarelas e araras das lojas, bem como na consciência dos consumidores. A moda circular enxerga as opções de toda cadeia de produção e prioriza o uso de materiais recicláveis e reciclados na criação de produtos com um ciclo de vida mais duradouro e sustentável, como propõem os preceitos da Economia Circular.

Designers, estilistas e algumas redes varejistas já estão aderindo ao movimento para imprimir nas suas roupas e cadeia produtiva o selo eco-friendly. As iniciativas, ainda que insuficientes, trazem um pouco de esperança para o ambiente, que é impactado pelas indústrias da moda e têxtil.

Só para ter uma ideia do problema: processos utilizando químicos no tingimento são responsáveis por cerca de 20% da poluição das águas, segundo relatório da Fundação Ellen Macarthur (2017). O setor é considerado o 2º mais poluente do planeta e, de acordo com dados da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente, é responsável de 8% a 10% das emissões globais de gases de efeito estufa, além de gerar uma grande quantidade de resíduos.

MC_moda-circular_02.png Fonte: Fios da Moda 2021/Fashion on Climate 2018

De acordo com o relatório Fios da Moda 2021, realizado pelo Instituto Modefica (@modefica) em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), cerca de 9 bilhões de peças foram produzidas no Brasil em 2018. Muitas delas ficam paradas no fundo dos armários até serem descartadas. Por ano, mais de 4 milhões de toneladas de resíduos têxteis - roupas velhas, retalhos da indústria da moda e peças de couro - vão parar em aterros sanitários. Quanta poluição - e desperdício!

MC_moda-circular03.png

Na circularidade, “lixo” não existe. Os resíduos viram matéria-prima para empresas praticarem o upcycling, processo que reaproveita os materiais sem perda de valor ou qualidade. O desafio, segundo Mariana Amazonas, ecodesigner e cofundadora da empresa de moda regenerativa RODA, é conseguir uniformidade dos resíduos para ser competitivo e economicamente viável. A solução tem sido apostar nas sobras da indústria, que gera mais de 30% dos resíduos, e tem maior capacidade de uniformidade. "Assim, conseguimos produzir modelos e mantê-los em linha, sem ter um custo de desenvolvimento para cada lote."

Ganha o ambiente, ganha o negócio e também o consumidor, que encontra peças únicas e personalizadas, com valor ambiental agregado. Confira a seguir algumas iniciativas da moda circular:

Renovar Têxtil

renovartextil2.jpg https://www.instagram.com/renovartextil/

Localizada na zona leste de São Paulo, a Renovar Têxtil é uma indústria que atua na reciclagem de resíduos têxteis há 35 anos. Matéria-prima para ela é descarte para outras indústrias da cadeia de fiação, tecelagem, tapetes e confecções de roupas. São os chamados resíduos pré-consumo formados por sobras de tecidos, fios, ourelas e estopas.

Esse insumo, fruto de compra ou doações de vários fornecedores que apostam em projetos de logística reversa, passa por um processo de desfibragem e é transformado por meio da reciclagem mecânica em fibras recicladas. Toda a operação possui menor impacto ambiental, uma vez que não é utilizada água - e nem produtos químicos.

Em um ano, segundo balanço interno, a empresa processa, em média, cerca de 1 milhão e meio de toneladas de resíduos têxteis classificados por cor e/ou composição, que poderiam parar em aterros sanitários. De volta ao mercado, no entanto, as novas fibras aumentam sua vida útil e são vendidas como estofamento para travesseiros e pelúcia, mantas acústicas e térmicas, feltros, placas automotivas, etc.

Nos últimos anos, o desafio é aumentar a capacidade produtiva, e reciclar uma quantidade maior de resíduos têxteis para atender diversos segmentos. “Para a empresa, a reciclagem é muito importante, a alma do nosso negócio, mas ela só é viável quando o mercado absorve na fabricação de novos produtos, ou seja, quando há demanda”, explica Daniela Passatuto, gerente da Renovar Têxtil.

Roda

JEEP_A_RODA_1225_edit.jpg https://www.instagram.com/vem.pra.roda/

Fazer como a natureza faz. É o que move a RODA, empresa pernambucana que recria a moda a partir de roupas esquecidas no armário, resíduos têxteis e até da indústria automotiva. Como a coleção feita com a Jeep, que chama a atenção com produtos como saias, casacos, sandálias, mochilas e bolsas feitos a partir de cinto de segurança, airbags, couro e outras sobras da produção dos carros.

A colab com a multinacional Stellantis, dona da Jeep, que tem fábrica de princípio Aterro Zero em Goiana, na Mata Norte de Pernambuco, prova como é possível ser sustentável e dar uma destinação mais nobre aos resíduos.

Segundo Mariana Amazonas, ecodesigner e cofundadora da RODA, o conceito é de Economia Circular. “É pensar o design dos produtos, pensando também no que eles podem virar no futuro.” E, ao pensar em novas utilidades, é possível agregar mais valor, gerar renda e engajamento social.

A iniciativa começou em 2019, com um projeto piloto de design regenerativo na Caxangá, no Recife, em parceria com costureiras e participação da comunidade. No final de 2020, motivadas pelas parceria com a Jeep, realizou um lab criativo que reuniu designers e artesãos para repensar os produtos. “A linearidade industrial faz com que as pessoas percam a habilidade de criar; e nosso objetivo é seguir criando coisas realmente novas, feitas para durar”, diz Mariana.

Em um ano de atuação, completados em novembro de 2022, a empresa contou com o envolvimento de mais de 50 profissionais e transformou 7 toneladas de resíduos em 5 mil produtos, que foram criados e vendidos. Com menos emissão de carbono e sem precisar explorar novos recursos naturais. Atualmente, está realizando consultoria e fechando parcerias com outras indústrias, para lançar novos produtos e seguir girando a roda da sustentabilidade.

Roupa Descolada

roupadescolada2.jpeg https://www.instagram.com/roupa_descolada/

Antes de ser projeto de moda sustentável, o Roupa Descolada foi semente. Ideia que brotou de um adolescente para um torneio escolar, bem no início da pandemia; recebeu o apoio de adultos para crescer e virar realidade; e do engajamento de toda a comunidade para se multiplicar. Essa história começou com Pedro e sua mãe, Alinye Amorim, em São José dos Campos, São Paulo.

Engenheira da computação por formação e escoteira de coração, Alinye vestiu - literalmente - a camisa para ajudar a divulgar a ação do filho, com então 12 anos. “Em um ano, ele cresceu 20 cm e perdeu todas as roupas e calçados. Ele imaginou como seria se pudesse trocar com outras pessoas”. E assim fizeram. Mas não sozinhos.

Após o torneio, Alinye procurou uma das professoras entusiastas para levar adiante o trabalho e, na Pastoral da Educação da cidade, ganharam a 1ª sede, na escola franciscana. Era agosto de 2020. De lá para cá, o Roupa Descolada virou ONG e ganhou mais duas unidades: uma na escola de Pedro, no mesmo ano; e outra na paróquia, no final de 2022. Esta última, aberta ao público geral.

Nas escolas, além das feiras semanais de trocas, os alunos participam de palestras para repensarem hábitos de consumo e o impacto no meio ambiente. Peças sem aprovação são customizadas, dentro do conceito de Economia Circular. “A camiseta não vai viver mais como camiseta, mas não precisa virar lixo. Ela pode virar matéria-prima para uma ecobag, que vai durar mais um tempão, e depois ainda pode virar um pano de chão, até não ser aproveitada.”

Em um ano de projeto, mais de 4 mil peças foram trocadas, entre roupas e calçados, envolvendo mais de 700 usuários. Com a atitude, mais de 14 mil kg de CO2 deixaram de ser emitidos na atmosfera (equivalente a 100 mil km rodados por um carro a gasolina) e 20 milhões de litros de água foram poupadas. Para a próxima fase, como não tem apoio financeiro, o Roupa Descolada quer oferecer mentoria e está buscando apoiadores para levar a iniciativa para mais escolas e se tornar sustentável.

Para seguir o fio

Conheça mais iniciativas que têm feito a diferença na moda circular:

O que é Economia Circular?

A Economia Circular propõe um novo olhar para nossa forma de produzir, consumir e descartar, a fim de otimizarmos os recursos do planeta e gerar cada vez menos resíduos. Ou seja, um modelo alternativo ao da Economia Linear - extrair, produzir, usar e descartar - que tem se provado cada vez mais insustentável ao longo da história. Na Economia Circular, a meta é manter os materiais por mais tempo em circulação por meio do reaproveitamento, até que nada vire lixo! Para que esse modelo se torne uma realidade, todos nós temos um papel a desempenhar. É um verdadeiro círculo colaborativo, que alimenta a si mesmo, e ajuda a regenerar o planeta e nossas relações.

Aprenda sobre Economia Circular

Se você tem interesse em conhecer mais sobre esse tema, acesse a Circular Academy, o primeiro curso latino-americano gratuito sobre economia circular voltado ao público geral. Todos nós, em parceria e colaboração, podemos fazer a diferença na construção de um planeta mais circular.

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